O muro de taipa da esquina da minha rua
Na esquina da rua onde moro há um terreno baldio cujo proprietário resolveu murar aproveitando as pedras existentes no local. O resultado foi um belo muro de taipa. Para quem não sabe os muros de taipas são construções de pedra usadas para demarcar e proteger propriedades, feitas com pedras soltas recolhidas no próprio terreno. O muro de taipa serve, assim, a dois propósitos: 1. retirar do pasto as pedras existentes aumentando a área útil; 2. Servir de tapada ou tapume para conter o gado, proteger plantações ou para delimitar a propriedade. Na sua forma mais rústica esses muros são simples amontoados de pedras dispostos linearmente. Na forma mais elaborada, os artesãos (taipeiros) quebram as pedras e as colocam umas sobre as outras, sustentando-as com táboas, de forma a manter a face externa do muro o mais uniforme possível, preenchendo os espaços entre as peças com cascalho e argamassa. O efeito final contrasta com a uniformidade dos muros convencionais feitos com paralelepípedos.
A arte de construção de taipas é muito antiga e são inúmeras as referências na literatura. Numa reportagem sobre as antigas fazendas do interior paulista (Jornal o Estado de São Paulo, 30/11/97) o autor (J.O) comentava que "Os estragos são visíveis tanto no prédio quanto nas antigas instalações que o cercam. A senzala desapareceu, o muro de taipa também está sumindo lentamente." Também Humberto Scavinsky de Alencar, num artigo publicado no Jornal O Estado de São Paulo, em 6 de novembro de 2001, sobre o Pico do Jaraguá, conta que "Há ruínas de um muro de taipa e de um tanque utilizado para a lavagem do ouro." O uso da taipa na construção de casas é muita comum ainda hoje no interior do Brasil. A foto mostra uma típica casa de taipa de Canudos.
O nome taipa, segundo o Aurélio, significa, numa primeira acepção, a parede feita de barro ou de cal e areia com examéis e fasquias de madeira; tabique, estuque, taipal, pau-a-pique. Numa segunda acepção Taipa é igual a tapa, sendo que taipa de mão significa taipa de barro atirado com a mão, e taipa de pilão aquela formada de cascalho e saibro socados. O muro a que me refiro enquadra-se nessa última definição. Segundo Corona & Lemos, Dicionário da Arquitetura Brasileira, Edart, SP, 1972, a taipa de pilão é um sistema de construção "(...) parecendo ter sido empregado desde tempos imemoriais no oriente, nos vindo através dos árabes, embora já fosse do conhecimento dos romanos. "
O termo taipa também é patronímico e toponímico . Em Macau, ex-colônia portuguesa, localizada na consta sul da China há 55 km de Hong Kong, fundada por missionários jesuitas e mercadores no século XV, existe uma ilha que se chama Taipa.
A noite de 20 de Dezembro de 1999, segundo o presidente da república popular da china, Jiang Zemin, em seu discursona cerimônia de transferência de poderes de Macau realizada pelos governos chinês e português, era "(...) cheia de luar, sopra a brisa refrescante, e o mar é sereno como de rosas." Nessas condições criava-se a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) gozando de autonomia e poderes executivo, legislativo e judicial independentes, depois de um processo de negociação que levou 12 anos.
A construção de taipa tem sido ainda assunto de dissertações de mestrado, como a da arquiteta Mariangela, que pedia ajuda no fórum de Arquitetura e Design para sua pesquisa de conforto ambiental em prédios históricos, solicitando "(...) informações sobre o conforto em construções de taipa de pilão, adobe e etc, mas "Tal qual a arte da cestaria que, segundo a Encyclopédie citada por Claude Lévi-Strauss (Olhar, escutar e ler. Cia das Letras, 1997,p. 128), "emprega matérias-primas fornecidas pela natureza em abundância e praticamente todas preparadas, exigindo, para o fabrico, apenas uma certa habilidade manual e pouco ou nenhum instrumento.", os muros e casas de taipa também não são tidos em alta consideração e tampouco são entronizados nos museus ou exposições de arquitetura ao lado de outras construções ou de artes aplicadas, com exceção talvez do Museu de Antropologia Osvaldo Rodrigues Cabral, da Universidade Federal de Santa Catarina, onde atualmente há uma réplica de uma construção de taipa aberta à visitação pública.
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