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Título: "Descontos indevidos e o tutorial do apocalipse digital para aposentados"


O governo descobriu o óbvio: que alguém — um ente invisível, provavelmente disfarçado de “Associação Nacional de Cofres Misteriosos” — andou metendo a mão nos vencimentos de aposentados e beneficiários do INSS. Fraude? Claro. Chocante? Só para quem não tem CPF.

E, como resposta, veio o alívio estatal: "Vamos devolver o dinheiro, sim, tá gente? Mas antes vamos só ali buscar de volta com os fraudadores." Que gracinha. Enquanto isso, os aposentados que quiserem contestar os descontos precisam fazer o quê? Usar o app Meu INSS. Com o quê? Com uma conta Gov.br. É isso mesmo. Resolver um problema no mundo físico com uma gincana digital. É tipo pedir pra sua avó de 82 anos fazer um Reels explicando o que é phishing.

Mais de 9 milhões de pessoas foram notificadas pelo aplicativo. Delas, 470 mil conseguiram contestar os descontos. O resto? Provavelmente ainda está tentando entender por que o celular trava toda vez que tentam abrir o navegador. Talvez estejam ligando para o neto, o genro, ou o padeiro da esquina que entende de "tecnologia" porque uma vez formatou um notebook em 2012.

A lógica é simples: o governo obriga aposentados a usarem tecnologia que não dominam, para impedir fraudes que o próprio sistema permitiu, e que agora promete ressarcir com recursos que saem antes mesmo de punir os culpados. É quase poético, se não fosse trágico. Ou se não fosse verdade.

Sem contar que essa mesma população — muitas vezes com mais de 65 anos, baixa escolaridade, pouco ou nenhum acesso à internet — foi jogada de cara em um ecossistema digital desenhado por jovens de 23 anos que acham que “scrollar” é instintivo, tipo respirar ou clicar em “aceito os cookies”. Para esses designers de interface, toda dificuldade se resolve com um gif animado sorridente e um botão azul escrito "avancar".

A ironia? Ninguém vai devolver tempo, paciência, nem a sanidade mental de quem teve que pedir ajuda ao neto para acessar uma conta gov.br com autenticação em duas etapas, reconhecimento facial, e senha que não pode conter seu nome, seu CPF, sua data de nascimento, ou qualquer coisa que um ser humano real consiga lembrar.

A fraude é feia, mas o processo de contestação é praticamente um crime de tortura mental assistida.

Talvez esteja na hora do governo criar um mascote simpático: o Seu INSSito. Um senhorzinho de bigode e suspensório que aparece na tela do celular gritando "TOQUE AQUI, MARIA, TOQUE AQUI!" em voz alta. E depois desaparece porque o aplicativo travou.

Ou talvez seja hora de fazer algo revolucionário: desenhar soluções pensando nas pessoas que realmente vão usá-las. Mas isso, claro, é bem mais difícil do que tirar dinheiro de aposentado.


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